Coluna Fragmentos: Leal, companheiro e fiel: Jorge Demiate

Lembro-me que logo nos dias que sucederam a eleição de Péricles de Holleben Mello à prefeitura de Ponta Grossa fui surpreendido pela indicação do empresário rural Jorge Demiate para o cargo de Secretário Municipal de Turismo. Conhecia-o apenas de nome e naquela altura, preconceituosamente, não podia conceber como alguém que, por origem, eu achava comprometido com os interesses das chamadas “elites campeiras” da região, poderia ocupar um cargo no primeiro escalão de um governo que fora eleito levantando a bandeira das causas populares e do enfrentamento aos tradicionais grupos políticos que sempre trataram à cidade como uma extensão de suas fazendas.

Passados alguns meses fui levado, pelo prefeito Péricles Mello, até a Secretaria de Turismo. O objetivo era apresentar ao responsável pela pasta o projeto Visões de Ponta Grossa. Confesso que compareci ao encontro um tanto contrariado. Chegando à sala de Demiate fui recebido por ele como se fosse um velho conhecido. Com seu jeito simples e bonachão, marcas inconfundíveis de sua personalidade, falou-me demoradamente sobre suas origens tropeiras, sobre a admiração pelo tio – Eurico Batista Rosas – seu mentor político, sobre seu amor por Ponta Grossa e pela história da cidade. Por fim, convidou-me para dividir com ele a autoria de um livro sobre seus antepassados que iniciaram a ocupação dos Campos Gerais.

Cerca de duas horas depois, ao sair da sala de Jorge Demiate percebi que havia construído uma imagem equivocada sem sequer conhece-lo. Havia encontrado um homem apaixonado pela história de Ponta Grossa e dono de um coração gigantesco.

Enquanto secretário do prefeito Péricles Mello, “Jorginho” preocupou-se com a estruturação de um plano diretor de turismo que não se fundamentava apenas na perspectiva do turismo de eventos. Seu objetivo foi sempre o de incentivar o turismo histórico e cultural, fazendo com que a identidade e a auto-estima dos ponta-grossenses fossem valorizadas.

Lembro-me que em seus depoimentos enquanto secretário municipal, Demiate sempre manifestou-se como um integrante da equipe de governo, não se colocando como o centro das atenções e invariavelmente defendendo, sob qualquer circunstância, o prefeito Péricles. Foi exemplo de lealdade, companheirismo e fidelidade com quem o indicara para o cargo.

Em 2003, Demiate desligou-se de sua função municipal para, com justiça, ocupar um cargo no primeiro escalão do governo Requião. Assumiu então o papel de legítimo representante dos Campos Gerais em nível estadual. Nos quatro anos que esteve no comando da Paraná Turismo, “Jorginho” demonstrou a mesma lealdade com o governador, jamais permitindo que as críticas feitas à Requião ficassem sem resposta. Coube justamente a Demiate desenvolver o maior produto turístico que a região dos Campos Gerais já teve: a Rota dos Tropeiros.

Se hoje os Campos Gerais emergem como pólo turístico e as populações de nossas cidades já conseguem vislumbrar no turismo uma fonte de sobrevivência e desenvolvimento, muito se deve a atuação destacada de Jorge Demiate.

Na condição de professor da Universidade Estadual de Ponta Grossa diversas vezes fui recebido por ele em Curitiba. Sua dedicação e disposição pessoal na busca de recursos, foram fundamentais para que diversos livros que tratam da história, do turismo e do meio-ambiente dos Campos Gerais fossem publicados e atualmente componham as bibliotecas das escolas ponta-grossenses.

“Jorginho” pessoalmente acompanhou-me em reuniões com diretores de inúmeros órgãos públicos, como a Sanepar, a Copel, a Mineropar, o IAP, a Secretaria de Cultura, a Imprensa Oficial etc., viabilizando patrocínios para os projetos de publicações ligadas a Editora da UEPG.

No último domingo Jorge Demiate faleceu. Ponta Grossa perdeu uma de suas mais expressivas lideranças políticas. Além de sentir o desaparecimento do líder político, também lamento a perda de um amigo que aprendi a admirar e respeitar. Infelizmente não levamos adiante o projeto de um livro escrito em parceria, por mais que esse tema sempre viesse à tona quando nos encontrávamos. Aprendi, na prática, com Demiate que lealdade, companheirismo e fidelidade são coisas que não se compram. Tais valores simplesmente nascem e morrem com algumas pessoas.

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O material original, com mais de 170 colunas, será republicado na íntegra e sem sofrer alterações. Por isso, buscando respeitar o teor histórico das publicações, o material apresentará elementos e discussões datadas por tratarem-se de produções com mais de uma década de lançamento. Além das republicações, mais de 20 colunas inéditas serão publicadas. Completando assim 200 publicações.

Publicada originalmente no dia 09 de março de 2008.

Coluna assinada por Niltonci Batista Chaves. Historiador. Professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Paraná.