Caminhoneiro estava com exame toxicológico vencido há 2 anos
Curiosamente, ele não pode ser multado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), em razão da Medida Provisória 1153/2022 , que está em discussão no Congresso
Publicado: 10/04/2023, 13:11
O condutor, de 36 anos, da empresa Rodoposser, responsável pelo acidente, na quinta-feira (06), na BR-376, em Ponta Grossa, envolvendo diversos veículos, está com exame toxicológico vencido desde março de 2021. Este é um dos fatos apurados com exclusividade pelo Estradas.com.br. Curiosamente, ele não pode ser multado pela Polícia Rodoviária Federal (PRF), em razão da Medida Provisória 1153/2022 , que está em discussão no Congresso, e adiou, para 1º de julho de 2025, as multas para quem não está com o exame em dia, beneficiando quem não cumpriu a lei.
O objetivo do legislador que instituiu a obrigatoriedade do exame toxicológico para os motoristas profissionais de carga e passageiros não era de apenas multar o condutor infrator mas, também, garantir que a sua CNH fosse imediatamente suspensa por 90 dias. No caso em questão, não só o caminhoneiro não pode ser multado em R$ 1.467,35, como sua CNH continua válida e o agente de trânsito nada pode fazer com a vigência da Medida Provisória.
PRF identificou irregularidades graves, inclusive dos pneus e freios
Logo depois da tragédia, os policiais rodoviários federais identificaram várias outras irregularidades; conforme relatou para a imprensa o inspetor Yuri Ranzani: “Os PRFs verificaram que o sistema de freio deles estava com defeito, inclusive com falta de peças. Uma das causas principais do acidente é essa“.
As autuações já aparecem no sistema da PRF, dentre elas, conduzir o veículo sem qualquer uma das placas de identificação; conduzir o veículo em péssimo estado de conservação; e conduzir o veículo sem o funcionamento adequado do sistema de iluminação. No total, até o momento, são 16 pontos na CNH.
Pelas informações obtidas com exclusividade pelo Estradas.com.br, além da situação precária dos freios do conjunto do bitrem, parte dos pneus estavam com arames aparentes.
O que revela o grau de irresponsabilidade do proprietário do bitrem, condutor e até mesmo coloca sob suspeita o dono da carga. Afinal, eram dezenas de toneladas transportadas num veículo com problemas visíveis de manutenção, além de outras irregularidades.
Carreta não poderia circular porque o tacógrafo está vencido desde 24/1/22
O Estradas.com.br apurou ainda, pelo sistema do Inmetro, que o veículo está com a verificação obrigatória do cronotacógrafo, a caixa preta do setor de transportes, vencida desde 24 de janeiro de 2022. Neste caso, conforme prevê o Art. 230 do CTB, é considerado infração grave, com multa e retenção do veículo para regularização.
As informações geradas pelo equipamento, como a distância percorrida, velocidade praticada no trajeto, inclusive no momento das colisões, e tempo de direção contínua do motorista, são essenciais para a perícia.
O motorista do bitrem, cuja colisão causou as duas mortes, chegou a ser preso em flagrante por homicídio e lesão corporal culposos, após a polícia identificar problemas de manutenção e outras irregularidades. Mas na sexta-feira (7), foi solto após decisão da Justiça.
Segundo informações da Polícia Civil, além do condutor do bitrem, a transportadora responsável pelo veículo será investigada no inquérito.
Não há, até o momento, informações se o dono da carga, com aproximadamente 38 toneladas de soja, também será convocado para depor. Afinal, colocou a carga num veículo irregular, que sequer poderia circular, além de permitir que o motorista dirigisse a carreta mesmo estando com o exame toxicológico vencido.
Para o coordenador do SOS Estradas, Rodolfo Rizzotto, não basta apurar a responsabilidade do motorista. “É preciso investigar todos os envolvidos, convocar os responsáveis pela transportadora, assim como o dono da carga.” Rizzotto lembra que ainda que a MP 1153/22 precisa ser revista imediatamente pelos legisladores. “Foram apresentadas várias emendas para corrigir a Medida Provisória que, pelo texto original, contribui para a impunidade, conforme o caso demonstra. A autoridade hoje sequer pode multar quem não fez o exame obrigatório que detecta uso de drogas.”
Rizzotto ainda enfatiza que é fundamental exigir o exame toxicológico do caminhoneiro para verificar se ele poderia ainda estar sob efeito de drogas porque o exame detecta o uso regular nos últimos 90 dias.
Portanto, dependendo do resultado e grau de positividade, ele poderia estar sob efeito de alguma substância psicoativa que altera seus sentidos e comportamento ainda que não tenha feito uso no momento da direção.
Caso o motorista se negue a fazer o exame será mais um indício grave que seguramente vai contribuir para que as autoridades e familiares das vítimas tenham mais elementos para apurar responsabilidades.
Da mesma forma, a empresa precisa explicar como permite que condutor com exigência legal tão importante, como o exame toxicológico, possa transportar dezenas de toneladas, num veículo tão precário. Cabe ainda ao Ministério Público do Trabalho investigar as condições de jornada dos motoristas da empresa e de manutenção da frota que eles dirigem.
Enterro das vítimas emocionou a cidade
Na manhã de sábado (8), em Ponta Grossa, a professora Vanessa Kubaski Maciel, de 37 anos, e seu filho Pedro, de 7 anos, foram sepultados. A tragédia comoveu moradores e a comunidade acadêmica do município.
“Vanessa Kubaski, sempre foi muito amorosa e dedicada com a educação. Pedro, um anjo. No tempo que pude estar em sala com ele sempre falava o quanto ele era amável e carinhoso”, escreveu uma amiga nas redes sociais.
O Estradas.com.br, como portal ligado a entidades de vítimas de trânsito, espera poder colaborar na apuração das responsabilidades nesta tragédia. Muito mais do que um veículo de comunicação, o portal é um instrumento em prol da redução da violência no trânsito e tem como missão combater a impunidade, que tantas vidas tem tirado nas ruas e rodovias do país.
É nossa forma de demonstrar respeito pelas vítimas e também por seus familiares. O senhor Lauro Maciel, pai da Vanessa e avô do Pedro, não aparece nas estatísticas de trânsito, mas também é vítima dessa tragédia e merece uma resposta adequada da justiça. Como a professora Vanessa seguramente ensinaria, é preciso aprender essa lição para evitar outros erros no futuro, que no caso do trânsito custam vidas.
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