Entidades e movimentos sociais lançam manifesto solidário
Além de oferecer denúncia aos órgãos responsáveis por descumprimento da garantia de direitos humanos, o documento cobra ações e transparência da Prefeitura de Ponta Grossa para moradia popular.
Publicado: 09/02/2022, 11:07
Além de oferecer denúncia aos órgãos responsáveis por descumprimento da garantia de direitos humanos, o documento cobra ações e transparência da Prefeitura de Ponta Grossa para moradia popular
Manifesto assinado por dezenas de entidades denuncia a ação da polícia no despejo ilegal de cerca de 60 famílias, na madrugada do dia 05, em Ponta Grossa, no Paraná. Aproximadamente 200 policiais cercaram a área, às 4h da manhã, quando as pessoas dormiam sob lonas, desmontaram as barracas e retiraram as famílias do local. Ali estavam crianças, jovens, adultos, idosos e idosas, refugiados, gestantes e pessoas com deficiência. A ocupação da área da Companhia de Habitação do Paraná (Cohapar), no bairro Cará-Cará, ocorreu no fim da tarde do dia 4. O espaço pertencia, até 2021, à Prolar (Prefeitura de PG). A ocupação foi coordenada pela Frente Nacional de Luta Campo e Cidade (FNL). Essa é a segunda ocupação de área urbana pública em Ponta Grossa. Em dezembro de 2021, outra área da Prolar foi ocupada por cerca de 700 famílias.
Segundo relatos, os ocupantes nem sequer conseguiram registrar a ação policial, pois tiveram celulares apreendidos pela polícia. O coordenador da FNL em Ponta Grossa, advogado Leandro Dias, foi detido e, no batalhão da PM, assinou termo circunstanciado, sendo liberado somente na manhã de sábado. De acordo com informações divulgadas na mídia local, a polícia foi acionada por representantes da administração municipal de Ponta Grossa, sob o comando da prefeita Elizabeth Silveira Schmidt (PSD) e do governo do Estado, Ratinho Junior (PSD).
Dados da própria Cohapar, publicados em fevereiro de 2021, indicam um déficit habitacional de 23 mil unidades só em Ponta Grossa. A cidade ocupa o quarto lugar no Estado e entre municípios com maior déficit de moradias no Paraná (atrás apenas de Curitiba, Londrina e Paranaguá), onde a estimativa é de que faltam cerca de 512 mil unidades. Ponta Grossa registra um déficit de 12% do total do Estado.
No documento as entidades e movimentos sociais ressaltam que a falta de moradia, agravado pela pandemia, revela o descaso do poder público e que “a única ‘solução’ que a Prefeitura e o Governo do Estado apresentaram foi uma operação policial fortemente armada para desalojar famílias sem casa”. Para os representantes que assinam o documento, “é preciso que a população, as entidades sociais, os representantes políticos, grupos de mídia, o poder judiciário e demais organizações cobrem providências, compromissos e responsabilidades urgentes dos atuais gestores”.
Entidades cobram transparência e respostas por parte da Prefeitura e do Estado
Além de registrar a solidariedade às famílias despejadas, as entidades e movimentos sociais cobram transparência das informações e ações por parte da prefeitura e do estado no que diz respeito às políticas públicas de moradia popular. As entidades questionam quem determinou a operação policial, sem processo e autorização judicial, com cerca de 200 soldados, em poucas horas, para desocupar área tomada por famílias sem teto.
A manifestação de solidariedade reforça ainda que é preciso respeitar o direito constitucional à moradia, previsto na Constituição Federal, artigo 6º, em que se exige a ação do poder público para dar efetividade a esse direito. Também repudia o descumprimento da decisão do Supremo Tribunal Federal, de 7 de dezembro de 2021. Tal decisão da corte impossibilita, até março deste ano, "medidas administrativas ou judiciais que resultem em despejos, desocupações, remoções forçadas ou reintegrações de posse de natureza coletiva em imóveis que sirvam de moradia ou que representem área produtiva pelo trabalho individual ou familiar de populações vulneráveis". Além disso, existem outras linhas de defesa do direito à moradia em âmbito internacional, como, por exemplo, a ONU-Habitat que estimula os países a parar todos os despejos e remoções durante a pandemia, pois afetam as populações pobres e vulneráveis.
Segundo o manifesto, não existem projetos de habitação popular pela administração local, há cerca de 10 anos. Ou seja, para as entidades o problema não é de agora, mas se agravou com a pandemia, que piorou as condições de vida da maioria da população pobre. “Não custa lembrar que o grupo político que administra a Cidade repete a promessa de um condomínio para idosos em Ponta Grossa em disputas eleitorais desde 2016 (também em 2020) e, até o momento, não teve nenhuma iniciativa concreta que amenize o problema habitacional também aos idosos na Cidade”.
A FNL publicou em nota divulgada no dia 6 de fevereiro, em redes sociais, que o objetivo da ocupação é “denunciar o desmonte da Prolar e a venda das áreas públicas destinadas a programas habitacionais populares em Ponta Grossa, para a iniciativa privada, com a finalidade da construção de condomínios particulares, ignorando dessa maneira a necessidade de Moradia de mais de 23 mil pessoas, que atualmente se encontram cadastradas na fila da Prolar”.
Conforme apontado no manifesto de repúdio, “é inaceitável que os responsáveis pela gestão pública na Cidade e no Estado tratem o problema socioeconômico da falta de moradia como um caso de polícia e que precisa ser resolvido sem aval judicial, em operações noturnas, às 4h da madrugada, quando as pessoas que sequer têm um teto para morar precisam sair em busca de outro espaço para abrigo”.
O documento será encaminhado ao Ministério Público Estadual (MP PR) e à OAB PR para que a Prefeitura e o Governo do Estado prestem esclarecimento sobre as condições em que a operação policial foi realizada na madrugada do dia 5.
Com informações: Assessoria de Imprensa.