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Coluna MSN: Carta bem comportada

“Carta do reitor de 1973 traz um discurso convencional”

Miguel Sanches Neto é escritor e reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa
Miguel Sanches Neto é escritor e reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa -

Da Redação

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O ano de 1973 tem uma simbologia muito forte para a Universidade Estadual de Ponta Grossa. É quando ela é reconhecida. Ano do primeiro FENATA. Era também o auge do endurecimento da ditadura militar, com aulas da universidade vigiadas por representantes do poder. Em algumas salas do prédio histórico ainda sobrevivem orifícios que seriam para os microfones que controlavam o conteúdo ministrado por perigosos esquerdistas.

Foi neste contexto que nosso primeiro reitor, o advogado e poeta Álvaro Augusto Cunha Rocha, escreveu a carta que, dirigida ao reitor do ano de 2023, eu pude ler no último dia 08 de setembro. Confesso que a carta me frustrou. Esperava um texto mais literário, mais visionário e mais crítico. Uma conclamação para que a universidade fosse um espaço de sonhos e de transformação da sociedade. Um exercício utópico saído da mente de um poeta.

Acabou sendo um ofício protocolar, que fala dos números da universidade, dirigido mui respeitosamente ao atual reitor como “vossa magnificência”, terminando com um não menos convencional “saudações universitárias!”. O passado da carta não tinha entusiasmo; e ela cumpria o modelo de redação da época. Parece até que foi escrita por algum secretário e não pelo professor Álvaro – é muito comum o reitor assinar o que produzem por ele, nem sempre no melhor português. Já no segundo parágrafo brota um gritante pleonasmo vicioso, tão comum entre os escribas burocráticos: “há cinquenta anos atrás”. Fiquei na dúvida se corrigia na leitura ou lia tal e qual. Optei pela fidelidade.

Não posso crer que o professor Álvaro tenha cometido frases desta natureza. Ao todo, não há brilho literário e nenhuma referência histórica mais realista, apenas um rosário de lugares comuns. Junto com a carta vem um catálogo dos cursos da universidade. Prevaleceu o documento oficial contra o discurso inflamado de defesa da universidade que eu aguardava.

Talvez os microfones instalados nas salas de aula e os famosos espiões plantados nas turmas pelo poder expliquem este cuidado com mensagens indesejadas, mesmo que para serem abertas cinquenta anos depois. 

O autor é escritor e reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa. No Instagram: @sanchesnetomiguel; no Facebook: https://pt-br.facebook.com/miguelsanchesneto/; no Twitter: @miguelsanchesnt.

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