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Coluna Fragmentos: Festas católicas: uma tradição em Ponta Grossa

A coluna ‘Fragmentos’, assinada pelo historiador Niltonci Batista Chaves, publicada entre 2007 e 2011, retorna como parte do projeto '200 Vezes PG', sendo publicada diariamente entre os dias 28 de fevereiro e 15 de setembro

No dia 19 de maio de 1968 o JM publicou notícia sobre a festa da paróquia de Santa Rita, na Ronda, detalhando a programação da mesma
No dia 19 de maio de 1968 o JM publicou notícia sobre a festa da paróquia de Santa Rita, na Ronda, detalhando a programação da mesma -

João Gabriel Vieira

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A procissão é um ritual encontrado desde as religiões antigas. Como no Ocidente há um predomínio do cristianismo, o imaginário coletivo tende a relacionar tal ritual a essa matriz religiosa. No entanto ela já fazia parte das religiões pré-cristãs, conforme indicam algumas passagens do Antigo Testamento.

No caso do Brasil, pais que a partir da chegada européia tornou-se predominantemente cristão, os rituais católicos – como festas e procissões – sempre tiveram grande influência e integraram o cotidiano da sociedade.

A partir do processo de colonização português, as religiões indígenas foram combatidas – por meio de uma catequização nem sempre pacífica – pelos princípios religiosos cristãos, sobrevivendo – com dificuldades – apenas entre alguns dos grupos que originalmente as cultuavam. As religiões de origem africana também foram combatidas pelos colonizadores, porém, sobretudo pelo sincretismo, acabaram sobrevivendo mesmo que “mascaradas” pelos símbolos católicos.

No entanto, não há como negar o predomínio histórico do cristianismo – principalmente do catolicismo – nas práticas religiosas e culturais brasileiras. Um exemplo que exprime com clareza tal predomínio são os feriados religiosos existentes em nosso calendário: Natal, Páscoa, Padroeira do Brasil, padroeiros locais, etc., todas datas cristãs e/ou católicas.

Em Ponta Grossa, inúmeros festejos católicos integram a história da cidade desde o seu surgimento. No último domingo, nesta mesma coluna, falei sobre o registro imagético produzido por Jean Baptiste Debret, em 1827, no qual todo destaque é dado a igreja ao redor da qual teve início o bairro de Ponta Grossa e que, mais tarde, tornou-se a Catedral de Sant´Ana. Isso indica a força da religião católica na formação histórica ponta-grossense.

Ao longo de seus quase 200 anos de existência, a cidade teve sua história marcada pela construção de inúmeras igrejas católicas por toda sua área urbana e viu a maior parte da sua população vincular-se a essa religião. Apenas nas últimas décadas, principalmente com o avanço das igrejas neo-pentecostais – a exemplo do fenômeno que ocorre em todo país –, é que o catolicismo local viu parte de seus fiéis optarem pela troca de religião.

Assim, as festas católicas sempre atraíram grande público na cidade. O principal destaque fica por conta da festa de Sant´Ana (misto de comemoração religiosa e festival mundano), promovida em louvor a padroeira de Ponta Grossa e que, principalmente, durante as décadas de 1930 e 1950 se configurou na principal atração religiosa dos Campos Gerais. Nos dias da festa ocorriam missas, procissões, venda de comida, leilões de prendas e sorteios com fins beneficentes, tudo em meio ao vai-e-vem ruidoso de fiéis pelas principais ruas da cidade, o que, muitas vezes, chegou a provocar um certo descontentamento no conservador D. Antonio Mazzarotto, primeiro bispo princesino.

Além de Sant´Ana, inúmeras festas realizadas pelas paróquias locais costumavam reunir um considerável número de participantes. O formato dessas comemorações era bastante similar ao encontrado na festa da padroeira. Nos dias que as antecediam, os vigários costumavam distribuir a programação entre os fiéis e nos estabelecimentos comerciais próximos à paróquia. Geralmente as comemorações iniciavam com a alvorada festiva, em seguida a missa, depois jogos e brincadeiras que se estendiam por todo o dia. A “suculenta churrascada” e a cerveja mantida em meio à serragem para se conservar gelada, também eram atrativos dessas festividades!

Nos últimos anos, pode-se dizer que, de modo geral, esse formato de comemoração católica não tem mais a mesma força. Mudanças socioculturais e a perda de fiéis explicam tal fenômeno. Mesmo assim, é bastante provável que boa parte dos leitores desta coluna – seja praticante assíduo do catolicismo ou até mesmo um fiel eventual – tenha, em algum momento de sua existência, compartilhado desse momento ímpar de religiosidade e sociabilidade. A identidade de nossa gente também se constitui – em parte – em rituais como esse.

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O material original, com mais de 170 colunas, será republicado na íntegra e sem sofrer alterações. Por isso, buscando respeitar o teor histórico das publicações, o material apresentará elementos e discussões datadas por tratarem-se de produções com mais de uma década de lançamento. Além das republicações, mais de 20 colunas inéditas serão publicadas. Completando assim 200 publicações.

Publicada originalmente no dia 08 de fevereiro de 2009.

Coluna assinada por Niltonci Batista Chaves. Historiador. Professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Ponta Grossa. Doutor em Educação pela Universidade Federal do Paraná.

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